INQUIETUDE POÉTICA

Joaquim Paiva

Série Romeiros (1986/2007)

Quem visitar a “Exposição Joaquim Paiva – Fotografias”, no Espaço SESC de Copacabana, poderá se deleitar com doze séries da produção autoral desse fotógrafo – e o vídeo-performance Cinzas.

Incluindo trabalhos de quase cinco décadas, a montagem da mostra, sob a curadoria de Betch Cleinman, apresenta um sedutor e, ao mesmo tempo, intrigante percurso. Cada série foi cuidadosamente organizada a partir de temas, que vão além das narrativas – aliando o intenso desejo de experimentação do autor e a refinada técnica fotográfica.

A inquietude poética de Joaquim Paiva, expressa num exacerbado experimentalismo, desenha afinidades com momentos emblemáticos da fotografia brasileira e internacional. Na série em preto e branco Jogo de Luz (2001), sente-se a ressonância das fotoformas de Geraldo de Barros (1950), no entanto, longe de qualquer nostalgia. Nessas fotos, valendo-se de um refinado estudo da luz, ele atualiza e ressignifica valores de uma geometria, que foi alvo na experiência de fotógrafos como José Oiticica Filho, Thomaz Farkas entre outros.

A cada série, Paiva busca, incessantemente, um novo alfabeto para construir o jogo poético no seu trabalho. Em Pontas de Filme (1985) a própria natureza do meio faz parte da narrativa da obra. Num tempo marcado pela presença espessa da fotografia digital como elemento da vida cotidiana, ele desestabiliza a expectativa temporal, e atualiza o obsoleto filme, numa proposta com forte apelo pictórico, que conjuga abstração e figuração – imagens que rompem com a ideia de uma teoria da representação como imitação do mundo, para fixar nela sua diversidade dentro de jogos de linguagens diferentes.

Em Romeiros (1986/2007), Paiva constrói um diálogo tridimensional a partir do suporte utilizado. A superfície escultórica cria um extravagante referencial físico para a imagem fotográfica. As duas fotos com grandes formatos surtem um enérgico efeito no espaço da Galeria.

A mostra na sua variedade evidencia relações formais, assim como, uma atitude de liberdade diante da maneira como ele registra suas experiências de vida. Os vários períodos mostrados manifestam de forma agradável que o desenvolvimento da linguagem fotográfica não se dá, necessariamente, de forma linear, mas num amalgama de tempo e cultura – com acenos discretos ao passado da fotografia e a atual ruptura do meio na contemporaneidade.

As doze séries levadas para exposição delatam a “desacomodação” de uma perspectiva cronológica Mas, Betch conseguiu chegar a um resultado harmônico, reunindo períodos distintos – com imagens que vão construindo um envolvente diário das relações psicológicas e pessoais do fotógrafo. A mostra é imperdível.

 

Espaço SESC – S2 – 29 de Março a 7 de Julho de 2013.

Rua Domingos Ferreira, 160 – Copacabana – Rio de Janeiro.

Tel. (21) 25470156

 

Por Joaquim Netto

Historiador e Crítico de Arte

Doutorando – PPGAV/EBA/UFRJ

 

A Busca | Crítica

A busca busca02 busca03

 

Em seu longa-metragem de estreia, Luciano Moura cria parábola sobre gerações

“Seu pai sabe que você está aqui?”, pergunta Theo, comprimindo em uma fala o abismo entre gerações. “Aqui, exatamente, eu espero que não”, é a resposta da menina.

Na sua estreia em longa-metragem, o diretor Luciano Moura escolheu transformar essa distância geracional em uma parábola sobre família e amadurecimento. Em A Busca, para encontrar Pedro (Brás Antunes), que foge de casa dias antes de completar 15 anos, seus pais precisam percorrer o sinuoso caminho (físico e emocional) que os separa do filho. Vendido como suspense, o filme passa longe das ocorrências policiais, e se prova um complexo drama de relacionamento. O desespero pela ausência de Pedro logo é preenchido por um processo de descoberta, da mãe (Mariana Lima), Branca, que reencontra o filho e o marido nos vazios da casa, e do pai (Wagner Moura), Theo, que conhece o filho, e a si mesmo, refazendo os passos da fuga.

O roteiro, escrito por Elena Soarez e Luciano Moura, cria uma estrutura onde nada surge gratuitamente, onde cada ação ou interação é carregada de significado. Das pequenas e constantes alegorias que representam a situação emocional da família – a piscina vazia, símbolo do lar desfeito pelo divórcio, ou uma cadeira quebrada, sinal da distância de Theo em relação ao próprio pai (Lima Duarte), por exemplo -, aos personagens que permeiam a busca por Pedro e às paisagens, urbanas e rurais, que compõe a jornada.

Apesar de abundantes, essas significações não se sobrepõem à narrativa, mas contribuem de forma calculada para o desenvolvimento de seus protagonistas. Wagner Moura é o maior responsável por não deixar o filme se perder nessa sua ânsia por encontrar alguma coisa. Comprovando seu posto entre os grandes do cinema nacional, assim como foram Paulo José, Othon Bastos, Geraldo Del Rey ou Paulo César Pereio em outros tempos, sua atuação sustenta o arco do seu personagem, que é a alma do filme em si, mesmo nos momentos mais frágeis da trama, quando tudo poderia desandar para o dramalhão.

Entre tantas comédias vazias, A Busca se prova um suspiro de alívio no cinema comercial brasileiro. Ancorado pela experiência na publicidade, Luciano Moura sabe como vender, mas sem subestimar seu público. Entrega um produto final complexo, sem cair no hermetismo. Um filme fantástico em alguns pontos, com um roteiro muitas vezes embalado pelo destino, mas emocionalmente verossímil. Não é de espantar que o longa tenha começado sua carreira entre os independentes no Festival de Sundancepara depois, com o apoio da Globo Filmes, emocionarBBBs em exibição especial no reality show. Prova absoluta de que o filme tem vocação para agradar a todos os públicos.

 Por Natália Bridi

“Divinas Divas” e a arte que não pode ser esquecida.

Divinas_Divas_ACRIMA20101230_0023_16

Foto: Jane Di Castro & Elenco

Terça-Feira (12/03/2013), eu assisti “Divinas Divas” no TEATRO RIVAL/PETROBRAS – RJ. Foi a primeira vez que desfrutei desse belo espetáculo – uma deliciosa mistura de musical com um elegante trabalho de humor. O Show, em cartaz há 9 anos sob a direção da talentosa Jane Di Castro, reúne um admirável elenco com: Brigitte de Búzios, Andrea Gasparelly entre outras celebridades desse campo artístico.

“Divinas Divas” é um show da refinada arte do transformismo, que se tornou uma das mais importantes referências da arte carioca. O espetáculo apresenta um repertório com as inesquecíveis composições da MPB, além das maravilhosas esquetes cômicas, que marcam com brilhantismo esse maravilhoso projeto. O Show contou com uma convidada especial: Zezé Motta e o seu vasto repertório musical.

Para falar um pouco desse trabalho, tão intenso e vivo, é importante perceber que o transformismo é uma arte que não pode ser esquecida. É um gênero artístico que tem como base, historicamente, a prática da performance, ou dos gestos “performatizantes”, no qual os artistas utilizam a transgeneração como suporte da sua arte. O show transformista cujas raízes estão no fazer teatral pode dialogar de forma muito próxima com a “homocultura”, com a cultura de massa e sua indústria cultural da prática social da transgeneração – que é cada vez mais ampla e complexa; mas, também, pode trazer questões relacionadas a outros fenômenos sociais.

Em “Divinas Divas” o trabalho do elenco envolve um esplêndido processo de imitação, e muito mais do que isso, uma interpretação performatizada de ícones ou personalidades artísticas da música, do teatro, do cinema ou do dia-a-dia. No entanto, cada artista empresta a sua carga emocional e ressignifica a obra apresentada. É, verdadeiramente, um trabalho autoral. Cada artista dá a sua “cara”, a sua leitura – as personagens ganham uma nova vida, uma nova roupagem, um novo brilho. Por isso, não posso vê-las se não como grandes atrizes. Mas, não como atriz no sentido convencional, ainda que ambas (transformista e atriz ) emprestem o seu corpo a uma personagem, porém, o transformista não interpreta um novo personagem a cada texto, mas sim, “incorpora” uma única “persona” que se manifesta em várias de suas personagens. Essa arte tão sutil é uma modalidade do fazer artístico. É uma forma artística entre tantas outras da grande área da interpretação. São diversas variações da arte de interpretar, e que conjuga diversas linguagens artísticas.

O Show “Divinas Divas” abarca um processo que utiliza muitos recursos, e o refinado talento artístico para atingir a exuberância de cada personagem selecionado, como, por exemplo, na bela interpretação da música de Édith Piaf, por Jane Di Castro.

“Divinas Divas” conquistou um público exigente, que sempre forma longas filas na frente do Teatro Rival para assistir a apresentação das artistas. É um “escândalo” de brilho, beleza, música e alegria. É imperdível!

Por Joaquim Cesar da Veiga Netto

Historiador e crítico de Arte

Doutorado – PPGAV/EBA/UFRJ